“Minha Bossa é Treta”: eis o nome de batismo do álbum de estreia da rapper paulistana Yzalú. Forte, contundente e impactante. E não apenas na mistura rítmica – que tem referências do samba jazz, rap, afrobeat e MPB –, mas por toda atitude que esse trabalho carrega. Não à toa que a artista, negra e da periferia, escolheu o dia 08 de maio, Dia Internacional da Mulher, para colocar o seu trabalho nas ruas.
O impacto de “Minha Bossa é Treta” começa pela capa estampada por uma Yzalú nua, coberta apenas por um violão e com a sua prótese da perna em evidência – que a acompanha desde a infância devido a uma deficiência congênita. Imagem simbólica que retrata a força de quem não teme se esconder e utiliza a arte para dar voz a discussões fundamentais para nossa sociedade.
“A arte permite falar de assuntos considerados tabus nesta sociedade já dita moderna, mas que ainda possui uma série de entraves que impedem de andar e evoluir. Muitas vezes com dois acordes e quatro versos já é possível mandar o recado. Nem todo mundo está preparado ou aberto para discutir assuntos que são feridas enraizadas e estruturais, mas é necessário, sobretudo, quando o interlocutor dessas falas possui conhecimento de causa e é aí que fica mais interessante e real”, avalia Yzalú.
Essa postura política se tornou parte da vida da rapper de maneira natural e veio junto com o seu amadurecimento pessoal, quando aos 17 anos começou a fazer as suas primeiras composições no violão. Porém, foi com a música “Mulheres Negras”, uma composição do rapper Eduardo, ex-Facção Central, que esse engajamento social se tornou mais forte.
“Eu falo de assuntos que dizem respeito à realidade que vivo, mas que não é uma novidade. O rap já trata sobre estes temas há muito mais tempo que eu, como a política e o preconceito racial. Eu posso citar o Moysés (ex-A286) que discute essa questão da limitação física mais profundamente, denunciando a forma como o sistema se beneficia de tudo isso; recomendo o disco ‘Brasil Deficiente’ que ele lançou em 2015 que é muito bom e necessário”, afirma Yzalú.
O álbum “Minha Bossa é Treta” permitiu que a cantora pudesse dar voz às suas inquietações, passar as suas mensagens e imprimir as suas influências rítmicas dentro da cena rap. A diversidade musical desse trabalho se deve à relação de Yzalú com o violão, que a permitiu explorar outras searas artísticas ao mesmo tempo em que desenvolvia o próprio rap no instrumento acústico.
Talvez pela abrangência desse trabalho, a produção de “Minha Bossa é Treta” foi intenso e exigiu da artista todo um esforço cultural. Algumas das canções já estavam prontas, a exemplo de “Deixo Ir” e “Teu Sorriso”, porém, outras precisaram ser compostas exclusivamente para o disco, como é o caso da faixa-título. “É um disco cru, simples e complexo, tudo ao mesmo tempo, tanto nos arranjos de cada elemento instrumental quanto nas ideias contidas em cada letra. ‘Minha Bossa é Treta’ é a concretização de uma realização pessoal”, define Yzalú.

O álbum ainda trouxe uma grata surpresa para todos aqueles que admiram o rap nacional. Yzalú foi autorizada a gravar uma música inédita do falecido rapper Sabotage: “Figura Difícil”. A música, gravada com batidas de violão, encanta na voz da cantora e homenageia um dos principais nomes do cancioneiro brasileiro – e dá um sabor especial para os órfãos do eterno maestro do Canão.
Essa qualidade e inovação em seu trabalho musical, aliada à sua expressão política, coloca Yzalú na linha de frente de um movimento musical que ganha força em São Paulo: a chamada Música Periférica Brasileira. Outros talentos da cena paulistana são incorporados dentro desse movimento e a rapper ganha a companhia de Criolo, Rael e Liniker. Uma reunião de talentos que tem dado suas contribuições para a quebra de paradigmas enquanto dão voz a uma realidade distante de parte dos brasileiros.
“Que há uma movimentação ocorrendo no cenário da música, isto eu não tenho dúvidas, e me sinto honrada e muito feliz por ser citada como um dos nomes deste movimento, mas ele é muito maior e vai além da música, como, por exemplo, os saraus e os coletivos. [A Música Periférica Brasileiro] é a expressão artística sob o olhar de quem está do lado de dentro da exclusão”, avalia Yzalú.
Escute o álbum “Minha Bossa é Treta”
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